domingo, 8 de março de 2015

X Exame de Ordem Unificado 2ª fase - Direito Administrativo – Contestação

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA ___ VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO









Francisco, nacionalidade, estado civil, motorista, RG nº..., CPF nº..., residente e domiciliado na rua..., nos autos do processo n..., proposta por Mateus, já qualificado nos autos, vem, por seu advogado, infrafirmado, com procuração anexa e endereço profissional na rua..., onde serão encaminhadas as intimações do feito, apresentar CONTESTAÇÃO às alegações do Autor, pelos fatos e fundamentos a seguir.

DO CABIMENTO

É cabível a presente contestação, com fulcro no Art. 297 e seguintes do CPC, por se trata de defesa em ação indenizatória.  

DOS FATOS

O servidor público Francisco, que exerce o cargo de motorista do Ministério Público Federal da 3ª Região, localizada em São Paulo, há tempo vinha alertando o setor competente de que alguns carros oficiais estavam apresentando constantes problemas na pane elétrica e no sistema de frenagens, razão pela qual deveriam ser retirados temporariamente da frota oficial até que tais problemas fossem solucionados. Contudo, nesse ínterim, durante uma diligência oficial, em razão de tais problemas, Francisco perdeu o controle do veículo que dirigia e acabou destruindo completamente a moto de Mateus, estudante do 3º período do curso de direito, que estava estacionada da calçada. Por essa razão, quatro anos depois do evento danoso, assim que obteve sua inscrição, como advogado, nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, Mateus ingressou, em causa própria, perante o Juízo da Vara Federal da Seção Judiciária de São Paulo, com ação de responsabilidade civil, com fulcro no Art. 37, § 6º, da CF/88, em face de Francisco e da União Federal, com o intuito de ser ressarcido pelos danos causados à sua moto. Na referida ação, Mateus alega que (i) não há que se falar em prescrição da pretensão ressarcitória, tendo em vista não terem decorridos mais de cinco anos do evento danoso, nos termos do Dec. 20.910/32; (ii) que, nos termos do Art. 37, § 6º, da CF/88, as pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, com fulcro na teoria do risco administrativo; (ii) que estão presentes todos os elementos necessários para configuração da responsabilidade civil.

DA PRELIMINAR DE CARENCIA DE AÇÃO

Primeiramente, o artigo 301, do Código de Processo Civil, determina que seja discutida preliminarmente a carência de ação, qual seja, a ausência de alguma das condições da ação. Vejamos:

“Compete-lhe, porém, antes de discutir o mérito, alegar:
X - carência de ação”.  

O Art. 37, § 6º, da Constituição Federal, por sua vez, determina que a ação indenizatória deva ser proposta somente em face do Estado, e não diretamente contra o agente público.

Com efeito, o STF definiu a existência da dupla garantia no que tange a norma do texto constitucional (artigo 37, § 6º), sendo que, de um lado, a vítima tem direito de acionar o Estado e, de outro lado, o agente público tem a garantia de somente ser acionado pelo Poder Público, ou pessoa jurídica a qual é vinculado.

Desse modo, Francisco não é legitimo para figurar no polo passivo da ação que lhe move o Autor, uma vez que isso contraria o disposto na norma do artigo 37, § 6º, da CRFB/88, e na Jurisprudência da Corte Suprema, a qual estabelece que a ação de indenização seja proposta diretamente em face do Estado, e não do agente público.

Portanto, à luz do Art. 37, § 6º, da CRFB e da jurisprudência do STF, não é possível que Francisco figure no polo passivo da ação de indenização, como ocorre no caso em epígrafe.

Logo, deve ser extinto o processo, com resolução do mérito, em relação a Francisco.

DA PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO RESSARCITÓRIA

O Art. 206, § 3º, inciso V, do Código Civil, define que a ação de responsabilidade civil prescreve em 3 (três) anos.

É cediço que a prescrição quinquenal, definido no Decreto n. 20.910/32, se aplica somente às ações contra a Fazenda Pública, não se estendendo àquelas que o agente público figura como réu.

Na situação em apreço, tendo em vista que se decorreram mais de 3 (três) anos do evento danoso, está prescrita a pretensão do Autor, devendo ser extinta a ação em relação a Francisco, nos termos do artigo 269, IV do CPC.

Na hipótese de serem superadas essas preliminares, em respeito aos princípios da eventualidade e da concentração da defesa, passa-se à análise do mérito.

DO MÉRITO

Primeiramente, o Art. 37, § 6º, da CRFB, define que a responsabilidade civil do agente público perante o Estado depende de comprovação de dolo ou culpa. Vejamos:

“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.” (grifei).

Trata-se, porém, da aplicação da responsabilidade subjetiva ao agente público que não respondem de forma objetiva pelos danos causados, tendo em vista que a teoria do risco administrativo somente é aplicada às pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado, prestadoras de serviços públicos.

Desse modo, a responsabilidade de Francisco é subjetiva, que é aquela segundo a qual deve ser comprovada, além da ação, dano e nexo causal, a culpa em sentido amplo, devendo ser comprovado que este agiu com negligência, imprudência, imperícia (culpa em sentido estrito) ou com intenção de causar o dano (dolo).

Além do mais, o acidente foi causado em razão dos problemas mecânicos que, inclusive, já havia sido informado previamente por Francisco ao setor competente, razão pela qual não há se falar em culpa ou dolo do servidor.

Ademais, na situação apresentada, trata-se da aplicação da teoria objetiva ou teoria do risco administrativo em face do Estado, no caso a União Federal, que se caracteriza pela necessidade de serem comprovadas, apenas, a ação do agente, o dano e o nexo causal entre ambos. Portanto, como dito anteriormente, esta teoria não pode ser aplicada a Francisco.

Sendo assim, está afetada a responsabilidade civil do agente público, ora Réu, devendo, portanto, ser extinto o processo em relação a Francisco.

DOS PEDIDOS

Pelo exposto, requer:

1. a declaração de carência da ação pela ilegitimidade de parte, extinguindo o processo sem resolução de mérito em relação a Francisco, nos termos do Art. 267, VI, do CPC;
2. o reconhecimento da prescrição da ação em face de Francisco, extinguindo o feito com resolução de mérito, em razão do acolhimento da preliminar de prescrição da pretensão ressarcitória, nos termos do Art. 269, IV, CPC;
3. em sendo superada as preliminares, sejam julgados improcedentes os pedidos do Autor, em razão da manifesta ausência do elemento subjetivo, necessário à configuração do dever de indenizar de Francisco.
4. a produção de todos os meios de provas admitidos em direito e necessários à solução da controvérsia, inclusive a juntada dos documentos anexos;
5. a condenação do Autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.

Nesses termos, pede deferimento.
São Paulo, data.

Advogado
 OAB/...

 

Questões discursivas do X Exame de Ordem


QUESTÃO 1

Enunciado

Durante o ano de 2010, o Município “T” concedeu subvenção social à Associação “S” para a instalação de projetos de assistência social para crianças com até seis anos de idade, totalizando o valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais). Ao final do exercício, foi encaminhada ao competente Tribunal de Contas do Estado (TCE) a prestação de contas dos recursos subvencionados. Em sua análise, o TCE detectou algumas irregularidades e, após o devido processo legal, oportunizando o contraditório e a ampla defesa aos interessados, imputou débito de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) ao Prefeito responsável pela concessão da subvenção e, solidariamente, à entidade subvencionada.

Considerando a situação hipotética apresentada, responda aos questionamentos a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

A) É juridicamente possível ao TCE, na análise da referida prestação de contas, imputar o débito à entidade privada?
B) Qual a natureza jurídica da decisão do TCE que resultou em imputação de débito por dano causado ao erário?

Resolução da questão

Primeiramente, cumpre ressaltar que cabe ao Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União, exercer a fiscalização das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, o controle externo das contas dos administradores, da administração direta e indireta, e de qualquer entidade pública ou privada, responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos, incluída as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público, a fim de apurar eventuais perdas, extravio ou outras irregularidades de que resultem em prejuízo ao erário, conforme o disposto no Art. 70, caput, e parágrafo único, c/c com o Art. 71, caput, e inciso II, da Constituição Federal.

Assim, aplicando-se o princípio da simetria, é possível a atuação do Tribunal de Contas do Estado (TCE) na análise da prestação de contas, imputando débito às pessoas jurídicas de direito privado que utilizem, gerenciem ou administrem bens, valores ou dinheiros públicos, na forma do Art. 70, parágrafo único, c/c Art. 71, inciso II, da CRFB/88.

Por fim, o § 3º, do Art. 71, da Carta Magna, dispõe que as decisões dos Tribunais de Contas, que resultem imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo. Logo, tais decisões possuem natureza administrativa com eficácia de título executivo.


QUESTÃO 2

Enunciado

Maria, jovem integrante da alta sociedade paulistana, apesar de não trabalhar, reside há dois anos em um dos bairros nobres da capital paulista, visto que recebe do Estado de São Paulo pensionamento mensal decorrente da morte de seu pai, ex-servidor público. Ocorre que, após voltar de viagem ao exterior, foi surpreendida com a suspensão do pagamento da referida pensão, em razão de determinação judicial. Em razão disso, deixou de pagar a conta de luz de sua casa por dois meses consecutivos o que acarretou, após a prévia notificação pela concessionária prestadora do serviço público, o corte do fornecimento de luz em sua residência.

Considerando a narrativa fática acima, responda aos itens a seguir, empregando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

A) À luz dos princípios da continuidade e do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão de serviço público, é lícito o corte de luz realizado pela concessionária?
B) O Código de Defesa do Consumidor pode ser aplicado irrestritamente à relação entre usuários e prestadores de serviços públicos?

Resolução da questão

Primeiramente, há de se ressaltar que o princípio da continuidade dos serviços públicos, previsto no Art. 6º, § 1º, da Lei n. 8.987/95, determina que a prestação de um serviço público não pode ser interrompida, salvo nas hipóteses previstas no § 3º, incisos I e II, da referida lei, qual seja: por razões de segurança ou por inadimplência do usuário.

Com efeito, o Art. 22 do Código de Defesa do Consumidor também exige que o serviço seja prestado de forma contínua, permanente, sem qualquer interrupção, visando assegurar estabilidade para os usuários por meio de sua manutenção de forma ininterrupta.

Contudo, não se pode olvidar que a remuneração do serviço público, prestado pela concessionária, advém como regra geral, da tarifa paga pelo usuário, tarifa esta que é parte essencial da manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, garantido constitucionalmente pelo Art. 37, XXI da CRFB/88.

Nesse sentido, o Art. 6º, § 3º, II, da Lei n. 8.987/95 expressamente prevê que a interrupção do serviço, após prévio aviso, quando houver inadimplemento do usuário, não caracteriza descontinuidade do serviço. Isto porque, a continuidade da prestação do serviço facultativo pressupõe o cumprimento de deveres por parte do usuário, notadamente o pagamento da tarifa.

Em razão disso, a falta de remuneração adequada, ante a aceitação do inadimplemento pelo usuário, poderia levar ao próprio colapso do serviço, o que afetaria a própria sociedade como um todo. Do mesmo modo, o equilíbrio econômico-financeiro do contrato restaria abalado caso a concessionária fosse obrigada a prestar o serviço ao consumidor inadimplente.

Portanto, é lícito o corte da energia elétrica de Maria, realizado pela concessionária, uma vez que se enquadra na hipótese prevista no Art. 6º, § 3º, inciso II, da Lei n. 8.987/95.

No que tange a alternativa “B” a resposta é negativa, pois, neste caso, estamos diante de um conflito aparente de norma, qual seja: a norma do artigo 22 do CDC determina a continuidade dos serviços essenciais, já a norma do artigo 6º da Lei n. 8.987/95 determina a continuidade do serviço público, mas excepciona em alguns casos. Contudo, tal conflito já se encontra pacificado na doutrina e jurisprudência, pela aplicação do critério da especialidade, haja vista que a Lei 8.987/95 busca disciplinar relação especial de consumo (usuário de serviço público), razão pela qual o CDC não se aplica irrestritamente aos serviços públicos, mas apenas de forma subsidiária.

QUESTÃO 3

Enunciado

O município “X”, tendo desapropriado um imóvel para a instalação da sede da prefeitura e, necessitando realizar obras de reparo no prédio, instala em terreno contíguo, de propriedade de Mário, o canteiro de obra necessário para a realização dos reparos.

Considerando apenas os fatos descritos acima, responda aos itens a seguir.

A) Qual é a figura de intervenção utilizada pelo Município e quais são suas características?
B) Nesse caso, é devida alguma indenização? Indique o fundamento legal.

Resolução da questão

Primeiramente, vale ressaltar que a lei prever algumas modalidades de intervenção na propriedade do particular, pelo Poder Público, com caráter temporário. Dentre elas pode-se destacar a requisição (para bens móveis) no caso de eminente perigo (Art. 5°, XXV, da CRFB/88) e ocupação temporária de terreno não edificado vizinho às obras e necessários à sua realização (Art. 36 do Decreto-Lei n. 3.365/41).

Na situação apresentada estar-se diante do instituto da ocupação temporária, prevista no Art. 36 do Decreto-Lei n. 3.365/41, que se caracteriza pelo uso transitório da propriedade do particular, por parte do Poder Público, como medida de apoio à execução de obras públicas vizinhas ao imóvel ocupado.

Ressalta-se ainda que nessa modalidade de intervenção restritiva da propriedade do particular (ocupação temporária), por expressa disposição do Art. 36 do Decreto-Lei n. 3.365/41, é devida indenização ao particular, ao contrário da medida expressa no artigo Art. 5°, XXV, da CRFB/88, que só é devida indenização ao particular, se houver dano.

QUESTÃO 4

Enunciado

Determinado Estado da Federação celebra contrato de parceria público-privada (PPP) patrocinada para a reforma e administração de área portuária. Estipulou-se no contrato que o parceiro privado será responsável pela construção de galpões de armazenamento de bens, com conclusão prevista para cinco anos após a celebração do contrato, e posterior prestação do serviço público. Também se estabeleceu que a sua remuneração dar-se-á de forma imediata pelo Poder Público e após o término das obras pelos usuários do serviço público, previsão admitida pela lei estadual sobre as PPP`s.

Sobre a hipótese, responda aos itens a seguir.

A) Tendo em vista que a Lei n. 11.079/2004 é aplicável a todos os entes da Federação (Art. 1°, § único), é válida a lei estadual que trate de parcerias público-privadas?
B) É possível a remuneração do parceiro privado nos moldes acima descritos?

Resolução da questão

Primeiramente, o Art. 22, XXVII, da Constituição Federal, estabelece a competência privativa da União Federal para legislar sobre normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III.

Por sua vez, o parágrafo único, do Art. 22, da CRFB, estabelece que a Lei Complementar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo. Sendo assim, a lei estadual pode disciplinar sobre Parcerias Público-privadas, de forma supletiva, no que não colidir com as normas gerais editadas pela União.

Portanto, a reposta ao item “A” é positiva, pois é competência privativa da União editar normas gerais sobre licitação e contratos, enquanto os Estados podem legislar de forma suplementar sobre questões específicas de interesse público, nos moldes do Art. 22, XXVII, e parágrafo único, da Constituição CRFB/88 c/c Art. 1º da Lei 11079/04, a qual regulamenta o procedimento licitatório e contratação de parceria público-privada no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

No que tange a possibilidades da remuneração do parceiro privado nos moldes apresentado no contrato, qual seja: de forma imediata pelo Poder Público e após o término das obras pelos usuários do serviço público, faz-se necessário ressaltar que o Art. 7º, da Lei n. 11.079/2004 estabelece que a remuneração pela Administração Pública, nos contratos de parceria público-privada, deve ser precedida da disponibilização do serviço objeto, disposição esta que tem caráter de norma geral.

Portanto, a previsão de contraprestação imediata, sem a disponibilização do serviço, objeto do contrato, não será possível, uma vez que essa cláusula contratual fere a norma preestabelecida no Art. 7º, da Lei n. 11.079/2004. 

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