Informativos do STJ

sábado, 7 de março de 2015

VIII Exame de Ordem Unificado 2ª fase - Direito Administrativo - Agravo de Instrumento







EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO X









Norberto, brasileiro, estado civil, desempregado, RG nº..., CPF nº..., residente e domiciliado na rua..., nos autos do processo nº..., em que litiga com o Estado X, já qualificado nos autos, vem, por seu advogado, infrafirmado, com procuração anexa e endereço profissional na rua..., onde serão encaminhadas as intimações do feito, interpor AGRAVO DE INSTRUMENTO em face da decisão que negou o pedido liminar, pelos fatos e fundamentos a seguir.

Em respeito ao disposto no artigo 524, III, do Código de Processo Civil, segue, anexo, o nome e endereço dos advogados, do agravante e do agravado.

Também, em observância ao disposto no artigo 525, inciso I, do CPC, seguem em anexo aos autos cópias da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e agravado.

DO CABIMENTO

É cabível o presente agravo de instrumento com fulcro no artigo 522 do CPC, não devendo ser convertido em retido, por se tratar de situação que pode causar lesão de difícil reparação, nos moldes do artigo 527, inciso II, do CPC.

DOS FATOS

Norberto, brasileiro, desempregado e passando por sérias dificuldades econômicas, resolve participar de concurso público para o cargo de médico de hospital estadual. Aprovado na fase inicial do concurso, o Agravante foi submetido a exames médicos, através dos quais se constatou a existência de tatuagem em suas costas. Por conta disso, Ele foi eliminado do concurso, com a justificativa de que o cargo de médico não era compatível com indivíduos portadores de tatuagem. Inconformado, Norberto ajuizou ação sob o rito ordinário em face do Estado, com pedido liminar, na qual requereu (i) a anulação do ato administrativo que o eliminou do concurso; e (ii) que lhe fosse deferida a possibilidade de realizar as demais etapas do certame, com vaga reservada. Ocorre que o juízo de 1ª instância indeferiu o pedido liminar, sob o fundamento de que a anulação do ato de eliminação e de reserva de vaga não seria possível, uma vez que isso significariam atraso na conclusão do certame e que a Administração Pública possui poder discricionário para decidir quais são as restrições aplicáveis àqueles que pretendem se tornar médicos no âmbito do Estado, de forma que o autor deveria provar que a decisão foi equivocada.

DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL OU DA CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO ATIVO

O Art. 527, inciso III, do CPC, prevê a possibilidade de se antecipar os efeitos da tutela recursal desde que presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora.

O periculum in mora decorre do fato de que o Agravante pode perder a sua vaga no concurso público caso esta não seja reservada.

O fumus boni iuris se baseia na violação ao princípio do livre acesso aos cargos públicos, além da afronta aos princípios da legalidade e da razoabilidade, na atuação administrativa.

Logo, é indispensável à suspensão do ato impugnado com a determinação da reserva da vaga do Agravante.

DO MÉRITO

Inicialmente, o Art. 37, inciso I, da CRFB/88, define que os cargos públicos são acessíveis a todos os brasileiros, na forma da lei. Vejamos:

“os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei”.

Tal dispositivo configura o princípio de livre acesso aos cargos públicos, desde que cumprido os requisitos legais.

Na situação apresentada foi negado ao Agravante o acesso a cargo público sem que houvesse dispositivo legal acerca da matéria.

Sendo assim, a decisão proferida pelo juízo de 1ª instância, que indeferiu o pedido liminar, é ilícita por afrontar diretamente ao princípio da legalidade.

Ademais, a discricionariedade administrativa está adstrita aos limites impostos pela lei e pelos princípios constitucionais.

No caso em apreço, a exigência da ausência de tatuagem viola os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, uma vez que a presença ou ausência de tatuagem não guarda qualquer relação com o exercício das funções do cargo de médicos.

Além do mais, à luz da Sumula 683 do STF, aplicada por analogia, só se pode estabelecer restrições para ingresso em cargo público por meio de lei e se estas restrições forem compatíveis com o exercício das funções do cargo, ou pela natureza das atribuições deste.

Assim, a decisão deve ser reformada, em razão dos vícios apresentados.

DOS PEDIDOS

Pelo exposto requer:

1. seja determinada a antecipação dos efeitos da tutela recursal com a reserva da vaga para que o agravante possa participar das fases seguintes do certame;
2. seja o presente recurso conhecido e provido com a reforma da decisão para que seja proferida nova decisão com a reserva da vaga do Agravante;
3. a juntada de comprovação do preparo;
4. a condenação do Agravado ao pagamente das custas processuais e honorários advocatícios.

Nesses termos, pede deferimento.
Local, data.

               Advogado
               OAB/...

Questões dissertativas do VIII Exame de Ordem Unificado


QUESTÃO 1

Enunciado

Uma determinada microempresa de gêneros alimentícios explora seu estabelecimento comercial, por meio de contrato de locação não residencial, fixado pelo prazo de 10 (dez) anos, com término em abril de 2011. Entretanto, em maio do ano de 2009, a referida empresa recebe uma notificação do Poder Público municipal com a ordem de que deveria desocupar o imóvel no prazo de 3 (três) meses a partir do recebimento da citada notificação, sob pena de imissão na posse a ser realizada pelo Poder Público do município. Após o término do prazo concedido, agentes públicos municipais compareceram ao imóvel e avisaram que a imissão na posse pelo Poder Público iria ocorrer em uma semana. Desesperado com a situação, o presidente da sociedade empresária resolve entrar em contato imediato com o proprietário do imóvel, um fazendeiro da região, que lhe informa que já recebeu o valor da indenização por parte do Município, por meio de acordo administrativo celebrado um mês após o decreto expropriatório editado pelo Senhor Prefeito. Indignado, o presidente da sociedade resolve ajuizar uma ação judicial em face do Município, com o objetivo de manter a vigência do contrato até o prazo de seu término, estipulado no respectivo contrato de locação comercial, ou seja, abril de 2011; e, de forma subsidiária, uma indenização pelos danos que lhe foram causados.

A partir da narrativa fática descrita acima, responda aos itens a seguir, utilizando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

A) É juridicamente correta a pretensão do locatário (microempresa) de impor ao Poder Público à manutenção da vigência do contrato de locação até o seu termo final?
B) Levando-se em consideração o acordo administrativo realizado com o proprietário do imóvel, é juridicamente correta a pretensão do locatário (microempresa) em requerer ao Poder Público municipal indenização pelos danos causados?

Resolução da questão

Primeiramente, cumpre ressaltar que a desapropriação consiste em modo originário de aquisição de propriedade, isso significa que o Estado recebe o bem novinho, sem ônus, como se nunca tivesse pertencido a alguém, conforme pressupõe o Art. 184, § 5º, da Constituição Federal.

Com efeito, a jurisprudência dos Tribunais Superiores é firme no sentido de que a desapropriação é forma originária de aquisição da propriedade e tem o condão de tornar o imóvel expropriado livre de eventuais nulidades que o acompanhavam e que a transferência do domínio resta aperfeiçoada com o pagamento da indenização, produzindo tal desapropriação todos os efeitos legais, conferindo a propriedade do imóvel ao ente público.

Portanto, a resposta ao item “A” é negativa, porque a desapropriação extingue o contrato de locação, liberando o bem de qualquer ônus real ou pessoal que incidia sobre a propriedade.

Já com relação ao item “B” a resposta é afirmativa, pois, assim como o proprietário, o locatário também pode sofrer danos em decorrência da desapropriação do imóvel, visto que a sociedade locatária experimenta prejuízos distintos dos suportados pelo proprietário. Em razão disso, o proprietário é indenizado pela perda da propriedade, nos moldes do Art. 5º, XXIV, da CRFB/88, enquanto que a sociedade locatária é indenizada pela interrupção do negócio e pela perda do estabelecimento empresarial, com base no Art. 37, § 6º, da Constituição.

Desse modo, a responsabilização civil do ente público no caso em apreço decorre do dano causado ao locatário pelo fato administrativo, independentemente de culpa e pela prática de uma conduta lícita do Pode Público.

Por fim, vale resaltar que o STJ, com base em precedentes, firmou jurisprudência no sentido de que o inquilino comercial tem amplo direito de ser ressarcido, independentemente das relações jurídicas entre ele e o proprietário, inclusive por perdas e danos causados pelo Poder Público.

QUESTÃO 2

Enunciado

O prefeito do município “P", conhecido como João do “P”, determinou que, em todas as placas de inauguração das novas vias municipais pavimentadas em seu mandato na localidade denominada “E”, fosse colocada a seguinte homenagem: “À minha querida e amada comunidade “E”, um presente especial e exclusivo do João do “P”, o único que sempre agiu em favor de nosso povo!” O Ministério Público estadual intimou o Prefeito a fim de esclarecer a questão. Na qualidade de procurador do município, você é consultado pelo Prefeito, que insiste em manter a situação. Indique o princípio da Administração Pública que foi violado e por que motivo.

Resolução da questão

O princípio da impessoalidade, estampado no caput do Art. 37 da CRFB/88, tem como finalidade impedir perseguições ou favorecimentos (tratamentos diferenciados benéficos ou prejudiciais) aos administrados. Desse modo, todo ato da Administração Pública deve ser praticado com o propósito de satisfazer o interesse público. Este princípio, quando relacionado com o princípio da finalidade, exige que a atividade administrativa seja exercida em atendimento aos interesses da coletividade, pois a finalidade de toda atuação da Administração Pública é a satisfação do interesse público.

Sendo assim, por força dessa regra constitucional, é vedado ao agente público favorecer ou perseguir alguém, sejam políticas, ideológicas ou eleitorais.

Além disso, numa das suas vertentes, o princípio da impessoalidade reporta-se à vedação da promoção pessoal do agente público, prevista no art. 37, §1º, da CRFB/88, pois os agentes públicos, no exercício de suas funções, correspondem à atuação da Administração Pública (teoria do órgão). Portanto, as obras públicas serão divulgadas sem citar nomes de agentes públicos responsáveis por elas.

Diante disso, na situação em apreço, houve violação direta ao princípio da impessoalidade, uma vez que a publicidade presente nas placas de inauguração da localidade não teve caráter educativo, informativo ou de orientação social, mas ato característico de promoção pessoal do prefeito, conduta esta vedada pelo art. 37, § 1º, da Constituição Federal.

QUESTÃO 3

Enunciado

O prefeito do município “X”, ao tomar posse, descobriu que diversos servidores públicos vinham recebendo de boa-fé, há mais de dez anos, verbas remuneratórias ilegais e indevidas. Diante de tal situação, o prefeito, após oportunizar o contraditório e a ampla defesa aos servidores, pretende anular o ato concessivo do referido benefício. Antes, porém, resolve consultar seu assessor jurídico, formulando algumas indagações.

Responda aos itens a seguir, utilizando os argumentos jurídicos apropriados e a fundamentação legal pertinente ao caso.

A) É juridicamente correta a pretensão do prefeito, considerando, hipoteticamente, não existir no município legislação disciplinadora do processo administrativo?
B) Diante da ausência de legislação local, poder-se-ia aplicar à hipótese a Lei Federal n. 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito federal?


Resolução da questão

Primeiramente, em razão do princípio da legalidade administrativa e o poder-dever de autotutela, o administrador público não pode e não deve compactuar com a manutenção de ilegalidades na Administração Pública e, por isso, tem o poder-dever de anular o ato, na forma das Súmulas 346 e 473 do STF.

No entanto, em razão do princípio da segurança jurídica, e, tendo em conta a boa-fé dos servidores, o recebimento do benefício por mais de dez anos, mesmo tratando-se de verbas remuneratórias ilegais e indevidas, sugere manutenção destas em favor dos beneficiários, uma vez que as verbas já se incorporaram ao patrimônio dos servidores, não sendo mais possível a sua restituição ao patrimônio público.

Com relação à possibilidade de aplicação da Lei n. 9.784/99, à hipótese apresentada, importante ressaltar que em regra esta lei tem aplicação restrita ao âmbito federal. Entretanto, é possível extrair seus conceitos e princípios básicos para aplicação extensiva em entes federativos diversos que ainda não possuem legislação própria para o processo administrativo.

Desse modo, no caso específico, é possível extrair da Lei Federal n. 9.784/99 a regra do artigo 54, que estabelece o prazo de cinco anos para a Administração Pública anular seus próprios atos, quando deles derivar direito a terceiros, desde que estes estejam de boa-fé.

Por fim, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento no sentido de que a ausência de regra expressa na legislação local para o exercício da autotutela não autoriza o entendimento da inexistência de prazo decadencial para anulação de ato administrativo que produza efeitos patrimoniais favoráveis a beneficiários de boa-fé, aplicando-se, assim, o prazo decadencial de 5 anos previsto no art. 54, Lei n. 9.784/99.

QUESTÃO 4

Enunciado

A União pretende delegar à iniciativa privada, mediante licitação, poderes de polícia administrativa na fiscalização de portos e aeroportos nacionais, compreendendo a edição de normas básicas, a fiscalização de passageiros e de mercadorias e a aplicação de sanções. Para tanto, formatou um modelo a partir do qual o vencedor do certame será definido pelo menor valor cobrado da Administração Pública para a prestação do serviço de fiscalização. A respeito da situação apresentada, responda, fundamentadamente, aos itens a seguir.

A) É possível a delegação, nesse caso?
B) É possível a delegação a uma autarquia criada para essa finalidade?

Resolução da questão

Primeiramente, é importante ressaltar que o poder de polícia é atividade típica de Estado, portanto não pode ser delegado à pessoa jurídica de direito privado. Nesse sentido, é pacifica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, inclusive na ADIN 1.717-6, na qual o Supremo entendeu pela possibilidade de delegação apenas de atos meramente preparatórios ao exercício do poder de polícia, mas não as funções de legislação e aplicação de sanções.

No que tange a possibilidade de delegação do poder de polícia a uma autarquia criada para essa finalidade, por se tratar de pessoa jurídica de direito público, dotada do ius imperii estatal, é possível essa delegação, uma vez que se trata de uma entidade pública criada para esta finalidade.

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